07 setembro 2009

OBRAS INÉDITAS

Amélia ligou o computador no outro dia.
Esfregou as mãos, frente ao ecrã, mordeu a língua e respirou fundo! Começou teclar!
Escreveu, escreveu, escreveu... todos os dias mais um bocadinho, mais uma letra, uma palavra, uma linha, uma página!

Dia após dia foi-se enchendo de coragem para imprimi-lo semanas mais tarde! A inspiração e a excitação da aventura levou-a a acreditar que tudo seria possível mesmo as hipóteses mais remotas, pelo menos naquelas duas horinhas que passava à secretária, ali sentada...

Entretanto, depois de vários dias de formatação e edição da "obra inédita", voltou novamente ao pc, ligou a impressora, instalou a pen, reviu uma última vez e dirigiu a seta para o pequeno simbolo da impressora. A impressora deu-lhe  aquele sinal estridente, tinha recebido a ordem.

Uma folha, duas, folhas... a primeira impressão terminou nas cento e nove páginas.
Ooops!!!! Eram cento e dez!... Oh não!... Grande catástrofe! Sentiu-se como se tivesse sido apunhalada por ela mesma!!

 Respirou fundo mais uma vez, de maneira a sentir-se mais calma, emendou o errou (quase insignificante) e retomou a impressão...

***

A maior decepção que se sofre acontece sempre que as espectativas ultrapassam a noção da realidade... Quando algo corre mal ou se desvia da linha, qualquer coisa, mesmo a mais despercebida, assemelha-se sempre a uma grande catástrofe!!
Por ora, os ponteiros continuam a contar, não acabou ainda o tempo, a ampulheta ainda está longe de ser virada, há que continuar a impressão.

... No fundo, no fundo... Amélia acredita! Apesar dos obstáculos continua a apegar-se às letras e chama por elas todos os dias. E acredita naquilo que ela considera até ser um disparate. Não e só o "amor que é o maior disparate do mundo", mas enfim!! É uma tola!! Uma grande tola esta menina pequenina!



Mais tarde, à moda antiga, muito, muito antiga, Amélia senta-se à secretária - já a noite irá longe - não com a companhia de uma vela de cera quase sem cera como ela gostaria mas Amélia olha as estrelas lá no alto azul-escuro do céu, respira fundo e escreve. O quê? Qualquer coisa... o que lhe vai na alma, provavelmente, ou algo que viu, algo que lhe tocou profundamente, sei lá eu! Eu nem sei do que falo!!

1 comentário:

Ana R. disse...

Recordo-me de uma noite, quente e demasiado tranquila, em que Amélia sobressaltada pelo êxtase na busca da obra perfeita, desabafa comigo a sua mais recente revolta para com todo um sistema informático, toda a sua ira para com uma obra que devia estar perfeita e que afinal tem algo que a torna na pior de todas, na mais horrível e inaceitável…. Coisa que era obviamente errada.
Amélia estava numa busca obsessiva pela perfeição, algo tão sublime desvaneceu-lhe esse seu encantamento.

Amélia, talvez submersa pela sua excitação na busca da sua obra prima, não quis saber sequer que com esse seu acto de revolta e busca pela perfeição acabou de desperdiçar um bem tão precioso como uma folha de papel.
Espero, e tenho fé, que Amélia tenha tomado consciência que esse seu acto de egoísmo e egocentrismo não passou despercebido pela mãe natureza, e como forma de reconciliação espero que Amélia dê a essas folhas uma última oportunidade de serem úteis. Peço a Amélia dê a essas folhas a oportunidade de desempenharem realmente o seu verdadeiro papel enquanto objectos preciosos para com a sociedade.

Apesar de tudo, Amélia tomou a opção correcta. Aquilo que para si era importante era deixar a sua obra perfeita, para poder dormir descansada e sentir-se reconciliada consigo mesmo. Basta agora reconciliar-se com a natureza….


;)
Brincadeirinha.
Beijos